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quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Imensa Amazônia

Contra a corrente, guardiões da floresta lutam para manter a Amazônia em pé



Área da reserva onde foi construída uma estrada e uma ponte
para escoar madeira ilegal
Marcelo Camargo/ Agência Brasil


“Uma estrada saía da vila do Guariba, passava por uma fazenda e ia para dentro da Reserva Extrativista Guariba Roosevelt. Essa estrada não tinha outro caminho, não tinha outra finalidade senão entrar na Resex. Lá foi encontrada uma esplanada onde se explorava madeira e era escoada por essa estrada para, provavelmente, ter toras esquentadas em Guariba mesmo, pois não vale a pena transportar a madeira bruta para muito longe. É provável que essas toras tenham sido serradas em Guariba e escoadas como legais”, conta o promotor.

Gerente da reserva, o funcionário da Secretaria de Meio Ambiente José Cândido Primo contou que a estimativa é que 4 mil cubos de madeira tenham sido retirados da Resex só no ano passado. “No distrito Guariba tem 42 serrarias no papel. Instaladas, são 18. Aptas para operar, são apenas 8.” Segundo ele, existe uma operação montada na região para forjar notas e transformar madeira ilegal em legal.

Ailton, que é presidente da Associação de Moradores, disse que os órgãos de fiscalização têm ido cada vez mais à reserva, o que era raro no passado. Ele defendeu a delimitação da área da reserva como medida para impedir invasões e deixar claro a área protegida. “Hoje não tem placa, cerca, nada. Isso vai facilitar até para que nós, moradores, também possamos ajudar a fiscalizar.”

Alisio Pereira dos Santos vive próximo ao irmão Ailton em uma colocação [área reservada a cada família, com espaço para casas, roça e pontos de extrativismo] às margens do Rio Guariba, também na comunidade de São Lourenço, dentro da Resex Guariba Roosevelt.

Alisio Pereira dos Santos, morador de São Lourenço, reclama dos impactos do desmatamento e das queimadas ao redor da Resex Guariba-Roosevelt
Marcelo Camargo/ Agência Brasil

Nascido e criado em São Lourenço, Alísio lamenta ter visto o desmatamento avançando tão rapidamente na região. “Apesar de a gente cuidar e manter a floresta conservada aqui na reserva, essa destruição total da mata em volta da área protegida está levando à diminuição de animais de caça e do volume da água do Rio”, avalia. Ele contou que nos últimos 20 anos, sempre a partir de agosto, a fumaça toma conta de toda a região. “É uma prática generalizada, especialmente entre grileiros”, lamenta. “A gente ainda come carne de bicho do mato, mas está difícil caçar por aqui agora. Os catetos, os veados, foram embora por causa das queimadas anuais.”

O especialista e chefe do Ibama Evandro Selva explicou que, após a destruição da mata original, é difícil recuperar a floresta e alcançar a mesma variedade de biodiversidade e equilíbrio entre espécie das originais. “Não existem cálculos precisos de quando uma floresta secundária vai atingir esse potencial em termos madeireiros e não madeireiros, mas estimo muito mais de 100 anos. Temos acompanhado florestas secundárias em campo e, às vezes, a pobreza da biodiversidade é tanta que poucas espécies sobrevivem nas áreas. Temos experiência com florestas de mais de 20 anos em que nunca foi registrada uma onça passando. Então, calculamos mais de 100 anos para alcançar a riqueza da original”, diz Selva.

Reserva Guariba-Roosevelt
Comunidade sobrevive da coleta da castanha
Criada em 1996, a Guariba-Roosevelt é a única reserva extrativista de Mato Grosso e é uma das últimas áreas de extrativismo tradicional no estado. A comunidade sobrevive da coleta da castanha, do óleo de copaíba e da borracha. Atrás das casas de madeira construídas nas margens do Guariba, a distância segura das variações do rio, também praticam agricultura orgânica para subsistência

Colocação típica da comunidade São Lourenço
Marcelo Camargo/ Agência Brasil

A área inicial da reserva era de 57.630 hectares, mas sempre foi considerada insuficiente pelos moradores da região, que contam que a área abrangia apenas 7 das 40 colocações da comunidade no Rio Guariba. Ou seja, a maior parte das áreas de roças, os castanhais, os seringais nativos e os locais privilegiados de pesca, coleta e caça estavam fora do limite protegido. Em 2007 a reserva foi ampliada para 138.092 hectares.

Além das colocações nas margens do Guariba, a Resex abrange outras comunidades que vivem nas margens no Rio Roosevelt.

Em 2015, numa decisão que foi revogada posteriormente pelo estado, a área foi reduzida para o limite original pela Lei 10.261/2015. Em abril do mesmo ano, o governo do estado voltou atrás na decisão e ampliou a área por meio de um decreto.

A criação da reserva extrativista estadual ainda não garantiu regularização fundiária da área protegida. Os fazendeiros que têm terras na região estão com as propriedades interditadas e aguardam indenização. Quando a área foi criada, em 1997, constavam registros e processos de títulos definitivos em favor de 37 proprietários, entre pessoas físicas e jurídicas.
Transporte precário deixa população vulnerável e dificulta o acesso à saúde, educação e programas sociais
As famílias que vivem na comunidade de São Lourenço, na Resex, enfrentam dificuldades de locomoção devido à falta de infraestrutura de transporte no local.
Um dos principais problemas relatados pelas famílias é a dificuldade de buscar atendimento médico em casos de urgência e de acessar políticas públicas.

Barcos são o principal meio de transporte dos moradores
Marcelo Camargo/Agência Brasil


Beneficiária do Bolsa Família há cinco anos, Artemísia Alves dos Santos tem quatro filhos e recebe R$ 250 por mês. Ela contou que as mulheres da comunidade viajam em condições precárias para buscar o benefício na cidade de Aripuanã todos os meses, sem o apoio da prefeitura. “Quando chega o dia do recebimento, ficamos na dependência de carona para irmos até a cidade. Às vezes vamos na carroceria de caminhões, às vezes, de moto. Se eu tiver que pagar para ir até a cidade, custa mais de R$ 300, não compensa”, explicou. Artemísia lembrou que os aposentados da comunidade enfrentam o mesmo problema.
continua...

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