Em 2020,
50 jornalistas foram mortos no mundo
ONG Repórteres sem Fronteiras
aponta alta de assassinatos em países que não enfrentam guerra ou conflito
armado. Brasil tem pelo menos dois casos ainda em investigação.
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Ato homenageia jornalistas mortos no México, país mais mortífero para os profissionais neste ano |
Ao longo do ano, 50 jornalistas
foram mortos em todo mundo em função do trabalho que desenvolviam. Desses, 34
não estavam em zona de guerra ou conflito armado, segundo relatório da
organização Repórteres sem Fronteiras (RSF) publicado nesta terça-feira
(29/12).
O número de mortos
"permanece estável" em comparação com os 53 jornalistas assassinados
em 2019, mas os profissionais cada vez mais "estão sendo assassinados em
países em paz", segundo o relatório, enquanto a proporção de jornalistas
mortos em zonas de conflito diminui.
O percentual de jornalistas
mortos em áreas de paz era de 42% em 2016, subiu para 60% em 2018 e chegou a
68% neste ano. No mesmo período, o percentual de profissionais mortos em zonas
de guerra ou conflitos caiu de 58% para 32%.
Os dados compreendem o período de
1º de janeiro a 15 de dezembro. A RSF destaca que menos jornalistas
desenvolveram trabalho de campo neste ano devido à pandemia da covid-19.
O México é o país mais mortífero
para a profissão, com oito mortos em 2020. "As conexões entre traficantes
de drogas e políticos permanecem, e jornalistas que se arriscam a cobrir isso e
assuntos relacionados seguem alvos de assassinatos bárbaros", afirma o
relatório.
Em seguida, estão Índia e
Paquistão, com quatro assassinatos cada, e Filipinas e Honduras, ambos com
três.
Crimes com crueldade
"Alguns deles foram mortos
em condições particularmente bárbaras", afirma a RSF, citando como exemplo
o jornalista mexicano Julio Valdivia Rodriguez, do diário El Mundo de
Veracruz, encontrado decapitado na parte oriental do estado, e o seu colega
Victor Fernando Alvarez Chavez, editor de um site de notícias local,
desmembrado na cidade de Acapulco.
Na Índia, o jornalista Rakesh
Singh "Nirbhik" foi "queimado vivo após ter sido pulverizado com
um gel altamente inflamável, enquanto o jornalista Isravel Moses,
correspondente de uma estação de televisão Tamil Nadu, foi morto com golpes de
machetes", relata a RSF.
No Irã, o estado condenou o
administrador do canal Telegram Amadnews, Rouhollah Zam, à morte e depois
executou-o por enforcamento.
Cerca de 20 jornalistas
investigativos foram mortos este ano, dos quais dez estavam apurando casos de
corrupção local e desvio de recursos públicos, quatro investigavam a máfia e o
crime organizado e três trabalhavam em questões ambientais.
Entre os jornalistas mortos em
2020, 84% foram deliberadamente visados e eliminados, em comparação com 63% em
2019. Os demais morreram durante trabalho de campo, sem que tivessem sido alvos
pela sua profissão, como durante a cobertura de protestos.
Nos últimos 10 anos, a RSF
contabiliza 937 jornalistas mortos em função de sua profissão. A Federação
Internacional de Jornalismo, por seu lado, registra 2.658 jornalistas mortos
desde 1990.
Prisões
Na primeira parte do seu
relatório anual, publicada em 14 de dezembro e sobre jornalistas
presos por seu trabalho, a RSF identificou 387 profissionais nessa
condição, "um número historicamente elevado".
Mais da metade das detenções é
registrada em cinco países: China, Arábia Saudita, Egito, Vietnã e Síria.
Cinquenta e quatro jornalistas são dados como sequestrados, em países como
Síria, Iraque e Iêmen, e quatro são tidos como desaparecidos em 2020, no Iraque,
Congo, Moçambique e Peru, conforme o levantamento. No caso da China, são 117
detidos.
De acordo com a RSF, mais de 130
profissionais de mídia em todas as partes do mundo foram presos neste ano por
causa de seu trabalho na cobertura da crise de coronavírus, "muitos apenas
por horas ou alguns dias, outros por semanas", afirma a organização,
acrescentando que atualmente 14 deles permanecem na prisão.
Um exemplo é o da jornalista
chinesa Zhang Zhan, detida em maio e condenada nesta segunda-feira (28/12)
a quatro
anos de prisão por ter publicado textos e vídeos sobre a eclosão dos
casos de covid-19 na cidade de Wuhan, que incluíam críticas à forma como o
governo gerenciou o início da pandemia.
A RSF começou a publicar seu
relatório anual em 1995 e considera casos de jornalistas e outros profissionais
que trabalham na área. O levantamento só inclui dados que puderam ser
confirmados.
Brasil
O relatório da RSF não indica
nenhuma morte ou prisão de jornalistas brasileiros em função de seu trabalho em
2020.
Uma outra organização
internacional, o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), registra um caso
de jornalista brasileiro morto em 2020, cuja motivação ainda está sendo
investigada pela entidade. Trata-se de Leonardo Pinheiro, morto na cidade de
Araruama, no Rio de Janeiro, em 13 de maio.
Pinheiro tinha uma página no
Facebook chamada "A Voz Araruamense", onde postava reportagens e
entrevistas sobre a cidade. Ele foi assassinado enquanto entrevistava
moradores. Dois homens se aproximaram em um carro, um deles saiu, pediu para
que Pinheiro se ajoelhasse e o executou.
Pinheiro também era líder
comunitário e filiado ao partido Patriotas, pelo qual pretendia se disputar uma
vaga de vereador nas eleições deste ano. Em outubro, a Polícia Civil prendeu
dois homens suspeitos de terem cometido o crime e concluiu que o assassinato
seria ligado à disputa pela vaga de vereador. O Ministério Público do Estado do
Rio de Janeiro informou ao CPJ que a morte não teria relação ao trabalho de
Pinheiro como jornalista.
Em 12 fevereiro, o jornalista
brasileiro Léo Veras também foi
morto, com 12 tiros, em Pedro Juan Caballero, no Paraguai, cidade que faz
fronteira com a cidade sul-mato-grossense de Ponta Porã.
Veras era responsável pelo site
de notícias Porã News, que cobre a disputa do narcotráfico na fronteira entre
Brasil e Paraguai, e já havia recebido ameaças. Antes de ser morto, ele estava
investigando duas mortes atribuídas a um pistoleiro da organização criminosa
PCC. Em maio, um suspeito pelo crime foi preso. O caso é acompanhado pela
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).
Um outro índice do CPJ, divulgado
em outubro, registra a impunidade dos crimes contra jornalistas, com o número
de assassinatos cometidos em função da atividade jornalística nos últimos dez
anos ainda não julgados e punidos.
O Brasil está em oitavo lugar
nesse ranking, uma posição acima da registrada no ano anterior, em um cálculo
que considera o número de casos em relação à população de cada nação. O
país tem 15 homicídios de jornalistas cometidos nos últimos dez anos e ainda
não solucionados, segundo o relatório.
Notica: dw.com