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terça-feira, 20 de setembro de 2016

Ainda a imensa Amazônia




                                                   
  Professor Ailton e a esposa, Artemísia dos Santos
       Marcelo Camargo/ Agência Brasil

O líder comunitário Ailton Pereira dos Santos, marido de Artemísia, disse que é comum as pessoas deixarem o benefício acumular por mais de um mês para compensar os gastos com a viagem. “Para ir até Aripuanã de ônibus, município vizinho de Colniza onde a maioria recebe, custa R$ 100. Ida e volta, R$ 200. Ainda é preciso somar a gasolina do barco para chegar até a estrada. O ideal seria que alguém buscasse os beneficiários para irem todos juntos à cidade ou que os benefícios fossem pagos na própria comunidade”, avalia Ailton. “Outro problema é que se atrasarmos mais de três meses, o benefício é bloqueado”, afirma Artemísia.

O acesso dos moradores a serviços de saúde também é precário. Para chegar até o posto de saúde mais próximo, no distrito de Guariba, leva-se até quatro horas nos barcos comuns da região, ou uma hora e meia em barcos rápidos até a ponte na estrada, mais 15km até o distrito. Se for necessário ir à cidade de Colniza, a viagem pode levar até seis horas.

Os moradores da comunidade se ressentem de meios de se comunicar. Não há rede de telefonia no local. Recentemente a escola da comunidade recebeu computadores. Para viabilizar o acesso à internet, painéis solares de um projeto do Ministério da Ciência e Tecnologia foram instalados. A expectativa para que a internet possa ser usada, principalmente entre os mais jovens, é grande, mas a data ainda não foi definida.

Algumas casas têm televisão que funciona com gerador, mas os entrevistados contaram que a principal fonte de informação da população ribeirinha é o rádio.

O professor Ailton Pereira dos Santos é o educador responsável pela escola de ensino fundamental da comunidade há 19 anos. Com cerca de 40 crianças de idades variadas, a escola fica na colocação em que Ailton mora, herdada do avô, que foi seringueiro. “Esse lugar aqui é uma colocação antiga que foi do meu avô, que viveu aqui há mais de 50 anos. E a gente está dando continuidade até hoje ao que ele deixou pra gente.”

                                 Crianças na escola da comunidade São Lourenço, na Resex Guariba-Roosevelt
                                                                  Marcelo Camargo/ Agência Brasil

Ele lembra que não havia escola em São Lourenço durante sua infância o que o obrigou a deixar a comunidade por alguns anos para estudar. “Os mais antigos não tiveram oportunidade de estudar, porque não tinha escola aqui. As pessoas viviam da extração dos produtos, não estudavam e não tinham formação. A partir da década de 90, começamos a reivindicar porque tinha muita criança aqui na época. Aí fundamos a escolinha, que começou com quatro alunos”, contou.

Devido a limitações climáticas, a escola não segue o calendário regular. O clima na região varia entre dois períodos bem definidos: o das águas, que chove muito, de dezembro a junho, e o da seca, que não chove e o nível do rio baixa. Como o transporte dos alunos é feito de barco, o acesso dos alunos na época de seca se torna inviável. “Reunimos a comunidade, discutimos uma proposta e apresentamos à Secretaria de Educação. Criamos um calendário que atende a comunidade. Dura sete meses. Começa em janeiro e vai até julho”, explicou Ailton. As crianças ficam o dia todo na escola, almoçam, praticam atividades paralelas, nadam, brincam, aprendem na horta e nos pontos de coleta.

  Menina brinca no Rio Guariba na hora do recreio da escola da comunidade ribeirinha São Lourenço, na  Reserva   Extrativista Guariba-Roosevelt - Marcelo Camargo/ Agência Brasil

No início, os alunos iam para a escola remando, muitos contra a corrente do rio. Hoje a comunidade tem um barco escolar, dirigido por Alísio, que busca os estudantes em casa.

Durante visita da equipe da Agência Brasil, no final de março, Artemísia e Ailton estavam apreensivos com a partida das duas filhas adolescentes, de 15 e 16 anos, para Juína, onde vão estudar no instituto federal da cidade. Como a escola da comunidade só vai até o 9º ano do ensino fundamental, quem quer estudar mais precisa ir embora.

A preocupação de Ailton é a mesma dos outros pais da região: além da insegurança com os perigos da cidade e da angústia de não ter os filhos por perto, eles temem que os jovens percam o vínculo com a comunidade e se afastem da cultura em que cresceram. “As pessoas terminam o fundamental e não tem jeito, se quiserem continuar precisam ir para longe. Isso não é legal. Se a gente pudesse trazer uma formação para a comunidade, ou mais próximo, seria melhor.”

Patrícia e Talia Santos tiveram que se mudar para Juína para estudar
Marcelo Camargo/ Agência Brasil

Patrícia e Talia Pereira dos Santos, filhas de Artemísia e Ailton, nunca haviam saído da comunidade nem se afastado dos pais. “Estou ansiosa e triste por ter que ficar longe da minha família e amigas”, disse Patrícia. “Eu preferia estudar aqui. Quero me formar e vir trabalhar pelo meu povo, não tenho vontade de ir para outro lugar”, disse Talia. Ela disse amar a vida calma de São Lourenço, onde gosta de pescar e nadar.

Desde meados de abril, as duas estudam em um curso técnico de meio ambiente no Instituto Federal de Juína. Elas se mudaram no dia 9 de abril e moram no alojamento do colégio.
continua...


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