Professor Ailton e a esposa, Artemísia dos Santos
Marcelo Camargo/ Agência Brasil
Marcelo Camargo/ Agência Brasil
O líder comunitário Ailton
Pereira dos Santos, marido de Artemísia, disse que é comum as pessoas deixarem
o benefício acumular por mais de um mês para compensar os gastos com a viagem.
“Para ir até Aripuanã de ônibus, município vizinho de Colniza onde a maioria
recebe, custa R$ 100. Ida e volta, R$ 200. Ainda é preciso somar a gasolina do
barco para chegar até a estrada. O ideal seria que alguém buscasse os
beneficiários para irem todos juntos à cidade ou que os benefícios fossem pagos
na própria comunidade”, avalia Ailton. “Outro problema é que se atrasarmos mais
de três meses, o benefício é bloqueado”, afirma Artemísia.
O acesso dos moradores a serviços
de saúde também é precário. Para chegar até o posto de saúde mais próximo, no
distrito de Guariba, leva-se até quatro horas nos barcos comuns da região, ou
uma hora e meia em barcos rápidos até a ponte na estrada, mais 15km até o
distrito. Se for necessário ir à cidade de Colniza, a viagem pode levar até
seis horas.
Os moradores da comunidade se
ressentem de meios de se comunicar. Não há rede de telefonia no local.
Recentemente a escola da comunidade recebeu computadores. Para viabilizar o
acesso à internet, painéis solares de um projeto do Ministério da Ciência e
Tecnologia foram instalados. A expectativa para que a internet possa ser usada,
principalmente entre os mais jovens, é grande, mas a data ainda não foi
definida.
Algumas casas têm televisão que funciona
com gerador, mas os entrevistados contaram que a principal fonte de informação
da população ribeirinha é o rádio.
O professor Ailton Pereira dos
Santos é o educador responsável pela escola de ensino fundamental da comunidade
há 19 anos. Com cerca de 40 crianças de idades variadas, a escola fica na
colocação em que Ailton mora, herdada do avô, que foi seringueiro. “Esse lugar
aqui é uma colocação antiga que foi do meu avô, que viveu aqui há mais de 50
anos. E a gente está dando continuidade até hoje ao que ele deixou pra gente.”
Crianças na escola da comunidade São Lourenço, na
Resex Guariba-Roosevelt
Marcelo Camargo/ Agência Brasil
Marcelo Camargo/ Agência Brasil
Ele lembra que não havia escola
em São Lourenço durante sua infância o que o obrigou a deixar a comunidade por
alguns anos para estudar. “Os mais antigos não tiveram oportunidade de estudar,
porque não tinha escola aqui. As pessoas viviam da extração dos produtos, não
estudavam e não tinham formação. A partir da década de 90, começamos a
reivindicar porque tinha muita criança aqui na época. Aí fundamos a escolinha,
que começou com quatro alunos”, contou.
Devido a limitações climáticas, a
escola não segue o calendário regular. O clima na região varia entre dois
períodos bem definidos: o das águas, que chove muito, de dezembro a junho, e o
da seca, que não chove e o nível do rio baixa. Como o transporte dos alunos é
feito de barco, o acesso dos alunos na época de seca se torna inviável.
“Reunimos a comunidade, discutimos uma proposta e apresentamos à Secretaria de
Educação. Criamos um calendário que atende a comunidade. Dura sete meses.
Começa em janeiro e vai até julho”, explicou Ailton. As crianças ficam o dia
todo na escola, almoçam, praticam atividades paralelas, nadam, brincam,
aprendem na horta e nos pontos de coleta.
Menina brinca no Rio Guariba na hora do recreio da
escola da comunidade ribeirinha São Lourenço, na Reserva Extrativista Guariba-Roosevelt - Marcelo Camargo/ Agência Brasil
No início, os alunos iam para a
escola remando, muitos contra a corrente do rio. Hoje a comunidade tem um barco
escolar, dirigido por Alísio, que busca os estudantes em casa.
Durante visita da equipe da
Agência Brasil, no final de março, Artemísia e Ailton estavam apreensivos com a
partida das duas filhas adolescentes, de 15 e 16 anos, para Juína, onde vão
estudar no instituto federal da cidade. Como a escola da comunidade só vai até
o 9º ano do ensino fundamental, quem quer estudar mais precisa ir embora.
A preocupação de Ailton é a mesma
dos outros pais da região: além da insegurança com os perigos da cidade e da
angústia de não ter os filhos por perto, eles temem que os jovens percam o
vínculo com a comunidade e se afastem da cultura em que cresceram. “As pessoas
terminam o fundamental e não tem jeito, se quiserem continuar precisam ir para
longe. Isso não é legal. Se a gente pudesse trazer uma formação para a
comunidade, ou mais próximo, seria melhor.”
Patrícia e Talia Santos tiveram que se mudar para
Juína para estudar
Marcelo Camargo/ Agência Brasil
Marcelo Camargo/ Agência Brasil
Patrícia e Talia Pereira dos Santos,
filhas de Artemísia e Ailton, nunca haviam saído da comunidade nem se afastado
dos pais. “Estou ansiosa e triste por ter que ficar longe da minha família e
amigas”, disse Patrícia. “Eu preferia estudar aqui. Quero me formar e vir
trabalhar pelo meu povo, não tenho vontade de ir para outro lugar”, disse
Talia. Ela disse amar a vida calma de São Lourenço, onde gosta de pescar e
nadar.
Desde meados de abril, as duas
estudam em um curso técnico de meio ambiente no Instituto Federal de Juína.
Elas se mudaram no dia 9 de abril e moram no alojamento do colégio.
continua...
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